Financiamento Público

Financiamento Público Exclusivo

Os gastos de campanha têm aumentado a cada eleição. Na mesma proporção aumentam as doações para as campanhas políticas. É difícil imaginar que esse aumento tenha relação com o maior interesse dos cidadãos pela política. Como mais de 90% das doações para as campanhas têm origem nas empresas, não seria implausível supor que essas doações visam a eventuais ganhos futuros. Logo, pode-se concluir que parte da corrupção que testemunhamos está relacionada às campanhas eleitorais.

Tendo em vista esse diagnóstico, diversos partidos ligados historicamente à esquerda – inclusive o PT – têm proposto a adoção do financiamento público exclusivo das campanhas como forma de desestimular a corrupção ligada às campanhas. Na visão dos defensores dessa tese, os políticos poderiam fazer suas campanhas sem que estivessem constrangidos pela necessidade de obter recursos para o financiamento delas, o que teria o efeito de reduzir a influência do poder econômico sobre o parlamento.

No executivo, impedir a doação de empresas evitaria acertos prévios com os candidatos sobre futuros contratos ofertados pelo administrador eleito. No legislativo, a vedação às doações eleitorais poderia livrar os candidatos da futura defesa de teses patrocinadas pelos financiadores de campanha.

Há, no entanto, desvantagens na adoção do financiamento público de campanha que nem sempre são lembrados. Primeiro, há o evidente custo das campanhas para o Estado. Hoje já é o dinheiro público que financia o tempo de televisão. O fundo partidário, também decorrente de repasses de dinheiro público, pode ser utilizado na campanha eleitoral. Ou seja, já há dinheiro público financiando boa parte das campanhas eleitorais. O que se quer é que mais dinheiro público seja utilizado para financiar estúdios, comícios, cabos eleitorais, gráfica, etc.. Os recursos públicos, é bom que nos lembremos constantemente, são escassos e finitos. Mais dinheiro público significa mais impostos. É necessário verificar se a sociedade está disposta a fazer mais esse sacrifício.

Outra desvantagem ligada ao financiamento público exclusivo se relaciona ao vínculo do político com o eleitor. Diversos países mais desenvolvidos que o nosso exigem que os políticos busquem recursos para suas campanhas junto aos eleitores. É o caso dos EUA, por exemplo, onde políticos passam dias telefonando pessoalmente para os eleitores em busca de apoio, inclusive financeiro, para suas campanhas. Para isso, é necessário que o político tenha ideias claras, represente uma parcela do pensamento da sociedade, para que o cidadão se motive não apenas a votar no político, mas também doar recursos para a campanha. Esse vínculo direto entre os cidadãos e o político é, em minha opinião, saudável para a democracia, reforça a relação entre o eleitor e eleito.

Há um terceiro aspecto que pode passar despercebido, pois é mais sutil. Caso o político não tenha a sua disposição tempo de televisão e verbas para campanha, será necessário que ele convença os eleitores que ele e suas ideias merecem a doação eleitoral para que aparições nas TVs possam ser compradas. Assim, os políticos e suas ideias terão maior exposição se for possível convencer maior número de pessoas a fazer doações. Políticos ou ideias com pouca representação na sociedade terão, também, poucos recursos, provavelmente nem sendo possível aparecer na TV. Com isso, torna-se praticamente inviável o modo inadequado com que alguns políticos fazem uso do tempo de televisão. Com vistas a se tornarem mais conhecidos no futuro, alguns políticos se candidatam nas eleições majoritárias apenas para se tornarem mais conhecidos para futura eleição ao parlamento. Candidatos sem nenhuma viabilidade eleitoral já se aproveitam do tempo de TV e do fundo partidário para se lançarem candidatos sem qualquer perspectiva eleitoral com o único objetivo de serem eleitos em futuros pleitos. Com o financiamento público exclusivo, esse quadro pode se agravar.

Há por parte dos defensores do financiamento público exclusivo de campanha a crença de que, com a proibição de todas as doações, o caixa 2 eleitoral seria exterminado. Sabe de nada, inocente. Caixa 2 se caracteriza justamente por ser operacionalizado fora das luzes republicanas, na noite dos acontecimentos, sem olhares alheios. Caixa 2 é doação não contabilizada, provavelmente decorrente de dinheiro sujo ou mal lavado. A proibição do Caixa 1 não afetará o Caixa 2, pois o Caixa 2 se relaciona ao crime, ao submundo, à corrupção, à negociata. Mais dinheiro pode garantir uma eleição mais tranquila. É evidente que o mau político não deixará de usar esse expediente.

Não aprecio doações de empresas. Prefiro as doações de pessoas físicas. Acho que o STF tem ido por um bom caminho ao banir as doações de empresas. No entanto, ainda penso que precisamos de menos dinheiro público nas campanhas, e não de mais. Precisamos de menos horários eleitorais gratuitos, que são absolutamente inúteis nas eleições proporcionais.

Analisando-se os prós e contras, sou favorável ao financiamento privado exclusivo das campanhas, com doações restritas a eleitores pessoas físicas. Não veremos políticos propondo isso, visto que irá contra seus interesses. Mas não podemos permitir que essa discussão se dê apenas nos parlamentos. Novos tempos demandam maior participação da sociedade civil. E a sociedade civil somos todos nós.

Gustavo Theodoro