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Da Nova Política

Marina Silva

A expectativa de mudança sempre traz em si uma mensagem de esperança. A realidade não é páreo para a utopia, para o sonho. Por isso, é comum vermos o sentimento de mudança, de tempos em tempos, prevalecer sobre o conservadorismo.

A Revolução Francesa ecoou por todo o mundo propagando seus ideais libertários. Kant acompanhava diariamente os jornais, ansioso por tentar compreender a maioria silenciosa, que não tomava parte dos acontecimentos, mas era vital para o curso da história. Sua torcida era para que a revolução construísse uma sociedade melhor. Burke, conservador inglês, defendeu o sistema parlamentarista monárquico com unhas e dentes, apontando as inúmeras conquistas que aquele regime tinha legado à Inglaterra, onde também era posto em cheque. Era o embate entre a esperança de melhoria com as mudanças contra o medo de perder o que já foi conquistado.

O historiador distante no tempo consegue perceber, nitidamente, as inúmeras mensagens positivas incorporadas pelo ocidente como fruto da Revolução Francesa; mas não deixa de reconhecer o enorme fracasso dos governos que sucederam a monarquia francesa nos anos seguintes.

Vivemos um novo dilema no País. Tivemos, a partir de 1992, governos que conseguiram levar adiante algumas reformas necessárias ao nosso desenvolvimento. É possível, no entanto, que estejamos vivendo um momento de transição. É preciso, antes, fazer uma breve rememoração de nossa história recente para que possamos observar com mais exatidão o momento atual.

Em 1989, nas primeiras eleições livres após a ditadura militar, restaram duas candidaturas no segundo turno: Collor, do PRN e Lula, do PT. O PSDB havia caído no primeiro turno. Todas as forças herdeiras da ditadura se alinharam à Collor. O PSDB não conseguiu seguir unido naquele segundo turno. Mário Covas deu apoio discreto à Lula, mas parte de seu partido fez campanha para Collor. Hoje pode parecer impossível uma coalizão entre PSDB e PT, mas naquele tempo era a opção natural. Mas o PSDB tinha expectativa de chegar ao poder no futuro e preferiu não aderir, unido, à campanha de Lula. Collor venceu e teve que governar com o PFL (DEM).

Com o naufrágio do Governo Collor, Itamar Franco pretendeu fazer um governo dos melhores. Chamou as principais forças políticas do País, dentre elas o PT e o PSDB, para um governo de coalizão, mas uma coalizão dos melhores. Desta vez foi o PT quem não quis participar do governo, frustrando pela segunda vez aqueles que gostariam de vê-los juntos. O PSDB saiu como o grande vencedor do Governo Itamar, pois foi no Ministério de FHC que foi gestado o Plano Real, que finalmente controlou os preços, levando a inflação a patamares civilizados.

Eleito FHC contra Lula, era necessário governar. O PT naquele momento pretendia aguardar as próximas eleições. O que restava no congresso eram as forças que haviam sido derrotadas com o fim da ditadura e com a derrubada de Collor: o PFL e o PMDB. Nomes como Jucá, Sarney, ACM, Renan Calheiros, começaram a se tornar importantes no governo tucano, enquanto a disputa PT e PSDB se acirrava. Quando Lula venceu as eleições de 2002, ninguém mais contava com a possibilidade de um governo composto pelas maiores forças políticas do País. Como disse Marina Silva recentemente, parte das melhores pessoas está sentada no banco de reservas há muito tempo. Enquanto isso, Renan, Collor, Jucá e Sarney dão as cartas.

Lula tentou o mensalão. Depois voltou ao velho presidencialismo de coalizão, com entrega de cargos e ministérios em troca de votos. O PT construiu a maior base de sustentação parlamentar desde a ditadura militar. Aos poucos somos informados dos métodos empregados.

Pesquisas captam que a população quer mudanças. A distribuição de votos do PT nesta eleição é semelhante à de Collor em 1989. Os grotões votavam em Collor, enquanto a população urbana votava em Lula. Naquele tempo, o petismo dizia que o voto esclarecido estava com o PT. Que os pobres não votavam em Lula por falta de informação. Agora são os grotões que votam no PT. O pessoal dos centros urbanos mais escolarizados quer mudança. Um observador imparcial, como eu, diria que quem se informa não vota no PT. O petismo tem outra explicação: para eles, os pobres não votavam no PT em 1989 por que eram ignorantes. Agora que votam, é porque o PT fez um Governo para eles.

Talvez o cansaço provocado por esta eterna briga entre PT e PSDB, que levou os piores quadros para o poder, é que esteja impulsionando a candidatura Marina Silva. Com a imagem do governo dos melhores, Marina retoma o sonho de Itamar em um momento em que aquilo parecia possível. A imagem de Sarney, Renan, Collor, Jucá e Lobão faz com que o PT seja visto como o velho, a opção conservadora. Como o PSDB parece não ter um candidato competitivo desta vez, o eleitor parece querer deixar para trás esse presidencialismo de coalisão por cargos que impera desde o Governo FHC. E Marina Silva parece ser a melhor opção para vencê-lo.

Gustavo Theodoro