A Disputa das Narrativas

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Diversas notícias de sites ligados à ex-Presidente Dilma informavam aos incautos a seguinte notícia:

Dois dias após impeachment, governo Temer sanciona lei que autoriza pedaladas fiscais”, Brasil de Fato

Senado aprova lei para que Temer possa pedalar”, Brasil 247

Muitos sites reproduziram textos com o mesmo teor. Luis Nassif foi ainda mais longe. Disse que “Senado toma decisão que inocenta Dilma Rousseff”. Eu até entendo que há uma disputa de narrativas no momento. Pelo que entendi, os opositores ao Governo Temer gostariam que os livros de história, daqui a 50 anos, comprassem a versão de que houve um golpe de estado em 2016. Acho curiosa essa ambição. Mas penso que não se deve distorcer os fatos de tal maneira.

Gostaria de pensar que os autores desses textos são somente ignorantes movidos pela paixão política. No entanto, parece-me que a maioria dos blogs entende que dissemina inverdades com o objetivo provocar maior indignação e aumentar a tensão desse momento tão conturbado. Tratemos, então, de deixar as paixões de lado e estudar o assunto.

É fato que no dia 1º de setembro de 2016 Temer sancionou a Lei 13.332/2016. O referido dispositivo normativo promoveu algumas alterações na Lei Orçamentária de 2016. A principal modificação é a alteração do limite de remanejamento autorizada pelos decretos de abertura de crédito suplementar, de 10% para 20%. Não há qualquer relação entre a lei aprovada e as pedaladas.

Vamos lá. Segundo o Senado Federal, Dilma cometeu dois crimes de responsabilidade: 1) autorizou abertura de crédito suplementar sem observar a meta de superávit primário; 2) atrasou os pagamentos do Plano Safra ao Banco do Brasil (pedalada fiscal). Quando muito, o assunto do crime de Dilma relativo à abertura de crédito é correlato ao assunto da Lei 13.332/2016.

No entanto, analisando-se o detalhe da redação, a flexibilização só aumenta os limites da edição de decretos que sejam neutros em relação à meta fiscal. Ou seja, no que importa, que é o cumprimento da meta fiscal, nenhuma alteração foi introduzida.

A expressão “desde que as alterações promovidas na programação orçamentária sejam compatíveis com a obtenção da meta de superávit primário estabelecida para o exercício de 2016 e sejam observados o disposto no parágrafo único do art. 8o da LRF e os limites e as condições estabelecidos neste artigo” estava contida na lei orçamentária aprovada em janeiro de 2016 e não foi modificada pela Lei 13.332/2016. Ou seja, o crime de Dilma relativo aos Decretos não foi perdoado. E a lei nada fala sobre as pedaladas fiscais, que continuam proibidas.

E mais. Se formos fazer uma breve, mas muito breve mesmo, pesquisa no site da Câmara de Deputados vamos constatar que a Lei 13.332/2016 teve origem no PLN 3/2016. O referido projeto foi encaminhado à Câmara, com a mesma flexibilização de limites aprovada, no dia 24 de abril de 2016, quando Dilma ainda era Presidente da República. Isso mesmo. O projeto é de iniciativa de Dilma, que só foi afastada da Presidência no mês de maio.

Há situações que as interpretações são possíveis e antagônicas. Para fatos como esses, transparentes, claros como o dia, quem os contraria coloca em dúvida a própria idoneidade. Em temas que dependam de fatos, a verdade nunca deixará de prevalecer. É como disse Zola:

Se você cala a verdade e a enterra no chão, ela crescerá e acumulará tanto poder explosivo que, quando estourar, vai jogar pelos ares tudo que estiver no seu caminho.

É isso. Neste caso acho que já estourou.

Gustavo Theodoro

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