Regina Duarte entrou para a história do marketing político em 2002 ao declarar ter medo do PT. Lula ganhou aquela eleição de José Serra por larga margem e a utilização do medo foi abandonada pelos responsáveis pelas campanhas políticas.
O tempo passou e o medo voltou a ser utilizado nas campanhas eleitorais; no início, de forma tímida, mas nesta campanha é ele que domina os debates. A polarização desta campanha era, de certa forma, esperada, visto que o velho confronto PT x PSDB foi retomado com a campanha de desconstrução de Marina Silva promovida pela campanha de Dilma Rousseff.
Se no passado campanhas eleitorais com esses protagonistas já me animaram, hoje só me provocam desalento. Neste sentido, pareço-me com Fernando Pessoa a regressar a Lisboa: tudo é velho onde já fui novo. Apesar do desalento, tratemos de esclarecer alguns pontos constantemente repetidos pelas torcidas organizadas de cada campanha.
Venezuela: não vejo no horizonte a possibilidade de o Brasil se transformar em um Venezuela. Toda essa história do Foro de São Paulo pode até impressionar os impressionáveis, mas a teoria do pacto das esquerdas latinas, se houve, está para ser derrotado, visto que metade do continente virou à direita. A Venezuela está em grave crise e a Argentina sentiu precocemente os efeitos da queda das commodities. Só a esquerda mais moderada – como a chilena – tem conseguido promover o necessário crescimento da economia. Nosso país tem instituições muito mais fortes do que os demais países do continente. E ainda que o PT permaneça na presidência, hoje o apoio popular a um futuro governo petista será insuficiente para o “golpe branco” aplicado pelos governos bolivarianos (se por acaso fosse essa a intenção do PT).
Fim do Bolsa Família: nenhum governo dará fim ao bolsa família. O bolsa família é programa focalizado. Ou seja, só os mais pobres recebem esses recursos. Economistas com forte traço liberal defendem a adoção de políticas focalizadas não só no combate à pobreza, mas também nas demais políticas sociais, como educação, saúde e previdência. Assim, mesmo um presidente neoliberal, mas com boa assessoria, manteria o bolsa família. Dizer que o candidato A ou B vai acabar com o bolsa família não passa de terrorismo eleitoral.
Privatizações: o Brasil teve um ciclo de privatizações. Usinas siderúrgicas, empresas de telefonia, mineradoras e demais concessionárias de serviços público foram privatizadas. Ninguém hoje pensa em rever as privatizações. São pertinentes diversas das críticas ainda hoje formuladas contra a forma como as privatizações se deram, seja pelo modelo adotado, seja pelo momento de baixa credibilidade em que o país vivia, seja pela utilização de moedas podres para pagamento das empresas. Ainda assim são poucos os que lembram com saudades das empresas públicas. E ninguém cogitou reestatizá-las. Hoje não parece a nenhum dos candidatos haver espaço para privatização de novas empresas. Ainda assim o tema privatizações é recuperado com objetivos puramente eleitorais, como se BB, CEF, Petrobrás e Correios estivessem prestes a serem privatizados. Apesar de ser antigo o truque, ele continua funcionando.
Corrupção: é outro tema que apela para o sentimento conservador das pessoas. O PT cansou de fazer uso desse tema nas campanhas de 1994, 1998 e 2002. Depois o tema passou a ser considerado udenista. Conversando com pessoas do outro campo, fica parecendo que o PT inventou a corrupção. E que se não tirarmos essa cambada do poder não sobrará Brasil para ser roubado. É impossível saber se hoje se rouba mais ou menos. O observador atento terá que concordar que se rouba um bocado. Mas não é certo que a mudança reduziria o valor da propina.
Economia: apoiadores tucanos têm divulgado que a reeleição de Dilma significa o fim do Brasil. Que se Dilma for reeleita, o país irá quebrar, viveremos recessão, perderemos o grau de investimento e teremos que voltar ao FMI. É evidente que o país necessita de um ajuste fiscal. A campanha petista não fala nisso, mas dá sinais de que 2015 será um ano difícil. Nada indica, no entanto, que o país sucumbirá ou que enfrentaremos dificuldades inauditas diante de vitória petista. As notícias da crise econômica são agravadas para que o medo decida a eleição.
Pobres: A campanha petista namora com o conflito pobres x ricos. Até agora esse tipo de campanha é mais afeita às redes sociais e aos comícios. Nesses espaços, tucanos, marineiros ou seja lá quem for são acusados de serem a favor dos ricos e contra os pobres, que só teriam o PT a seu lado. Isso não passa, evidentemente, de falácia, já que nenhum embaraço foi criado aos ricos durante os 12 anos de governo petista. Os empresários com faixa salarial acima de R$ 20 mil reais continuam pagando menos IR do que um assalariado que recebe R$ 10 mil (proporcionalmente). O velho ITR – imposto federal que poderia acelerar uma reforma agrária de terras improdutivas sem desapropriações – continua irrisório. Estudos recentes demonstram que os 0,1% mais ricos voltaram a abocanhar o crescimento econômico no governo Dilma, ao contrário do disseminado pelos institutos subjugados, como o IPEA. O senso comum de que o PT é a favor dos pobres enquanto os tucanos são contra não encontra respaldo na realidade. Aliás, pelas minhas convicções, um governo mais liberal, que focalizasse os gastos em saúde, educação e previdência, poderia fazer mais pelos pobres do que as aparentes benesses governamentais de nomes esquisitos.
O medo é arma dos conservadores. A esperança é a arma dos progressistas. O medo provoca desconforto e está aumentando o contingente de votos nulos. Já passou da hora de os candidatos voltarem a se concentrar no futuro. É difícil abandonar o discurso do medo pois, como dizia um grande economista do passado, John Stuart Mill, não é aquele que tem esperança quando há desespero, mas aquele que se desespera quando há esperança que é admirado por todos como sábio. Na política, sábio é o que consegue reunir em torno de si as melhores energias do país, o conjunto de pessoas capazes de pensar o país e colocá-lo no caminho do desenvolvimento. Para você, quem é capaz disso?
Gustavo Theodoro