Certezas e Dúvidas

Preconceitos, como todos sabemos, nos são muito úteis. Nos dispensam de pensar sobre centenas de assuntos para os quais tomamos caminhos quase sempre automáticos. Nem sempre este termo teve a conotação pejorativa que tem hoje. Já foi um termo utilizado positivamente, representando o conhecimento acumulado por um grupo.

Ainda assim, vez por outra precisamos rever algumas questões que há muito estão sedimentadas em nosso ser, mas que nunca chegaram a ser objeto de reflexão por nós mesmos. Este tipo de enfrentamento nos auxilia no esclarecimento de nossas próprias posições. Não sou muito partidário do conceito de metamorfose ambulante, pois parece indicar pessoa sem profundidade, que adere à moda do momento. Por isso, sou partidário de visitarmos a tradição, lermos os clássicos, conhecermos nosso passado e nossa história, a fim de conhecermos o terreno em que estamos pisando.

A questão que atualmente me intriga é o incrível descrédito da política nos anos em que vivemos. Na Grécia antiga, na pólis, era considerada a mais importante atividade da vida ativa, ainda que tivesse status inferior à vida contemplativa. Platão propugnava uma ditadura de filósofos – em oposição à democracia grega – pois ele percebeu o risco de sua atividade e imaginava que só um Governo de filósofos poderia garantir a vida daqueles que se propunham a pensar.

Platão, como sabemos, foi discípulo de Sócrates, personagem polêmico e considerado fundador da filosofia tal como a conhecemos hoje. Sócrates incomodava justamente por fazer pensar e, com isso, pôr em risco a juventude ateniense. Por este crime, foi julgado e condenado a tomar cicuta. Este foi seu fim.

Os romanos, ao contrário, não eram dados a abstrações. Pessoas de senso prático, consideravam a política a mais nobre das atividades humanas. Tinham especial apreço pelos contratos celebrados e pela certeza da possibilidade de entendimento entre as pessoas, ainda que reconhecendo suas diferenças (aliás, neste tempo, o princípio da igualdade estava longe de ser tratado como um direito natural sendo, pelo contrário, refutado na maioria dos textos legais da época).

Santo Agostinho, neste contexto, celebrava a capacidade humana de produzir algo novo onde antes nada existia. Isto tanto podia valer para o nascimento de alguém em um mundo preexistente como a fundação de uma cidade a partir de um acordo. É o que levou Catão a dizer que “a constituição da república não foi obra de um homem ou de um tempo”.
Rememoro estes fatos sempre ressalvando que a história, tal como a conhecemos hoje (que parece ter uma direção, um sentido), é uma invenção bastante moderna, talvez da época de Hegel. Homero, o grande historiador helênico, nunca imaginou um sentido para sua odisseia. Tratava ele da imortalidade dos grandes feitos e do relato das virtudes, mas não da condução da história da humanidade em um certo sentido.

O que tudo isto tem a ver com os dias atuais? Penso que a compreensão dos valores vigentes nos diversos períodos históricos, ainda que não nos deem de modo algum solução para os impasses atuais, podem nos ajudar a compreender o atual descrédito na política e a falta de valor da palavra como fonte de manifestação da verdade, o que impossibilita o estabelecimento de acordos e contratos que, ao lado da livre exposição de opinião e da correta representação, são o meio de ação da política.

Bom, ainda não cheguei a lugar nenhum, mas sigo nesta linha em breve.

Gustavo Theodoro

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