Continuo averiguando as razões de nosso afastamento da vida política e do concomitante encolhimento do espaço público. Recente pesquisa divulgada pelos jornais nos informou que os políticos da Alemanha têm idade média de 58 anos. Média é um conceito estatístico fraco, mas podemos inferir que, mesmo em um País desenvolvido, com bom IDH e PIB per capita, a política não atrai os jovens.
Aqui no Brasil, temos o hábito de esculhambar os políticos (não chega a ser um hábito apenas nosso). E os políticos, aqui no Brasil, raramente nos decepcionam, sempre tendo o comportamento vil que esperamos deles.
A questão tem bases bastante profundas e pretendo, quem sabe, um dia respondê-la integralmente. Sinto, no entanto, que o abandono da busca da verdade e, principalmente, o abandono da verdade como conceito político tem provocado parte deste afastamento.
Os gregos tinham desprezo acintoso pela opinião (doxa), que, segundo eles, nos afastava da verdade (aletheia). Platão, na descrição do mito da caverna, revela a forma como estes conceitos eram considerados pelos gregos. Os habitantes da caverna só viam as sombras projetadas nas paredes. Para Platão, eles viviam no mundo onde imperava a opinião, a doxa. Já o filósofo tinha a capacidade de se libertar dos grilhões e até sair da caverna, onde a luz o cegava, mas onde o filósofo tinha acesso à verdade (aletheia).
Na descrição do mito, o filósofo, ao voltar para a caverna e contar a verdade, percebe que a verdade a que ele teve acesso era tratada como opinião. Nietzsche, em seu Zaratustra, descreve o mito de forma semelhante, sendo o filósofo não compreendido pelos demais.
É interessante observar como, na política, os políticos se esforçam para fazer algo pior: confundir a opinião com a mentira propriamente dita.
Os conceitos de esquerda e direita estão em constante rearranjo desde a revolução francesa (onde os termos emergiram). Lembrei anteriormente que, aqui no Brasil, nos anos 1990, focalização dos gastos públicos era programa da direita e era odiada pela esquerda. Neste sentido, tanto o Obamacare como o Bolsa Família, que são programas focalizados (isto é, são direcionados a uma parcela menos favorecida economicamente da população, ou seja, os pobres), deveriam ser encarados como programas ligados ao campo da direita.
É interessante observar que, em 2002, o então pré-candidato do PT, Lula, se manifestou contrariamente ao Bolsa Escola pois, segundo ele em declaração gravada, o importante era dar emprego e, além disso, deveríamos “ensinar a pescar e não dar o peixe”.
Esta opinião está absolutamente de acordo com o modo de pensar da esquerda até então. No entanto, passados mais de 10 anos desses acontecimentos, o debate político evoluiu. Há um partido em formação, que se diz da direita liberal (o Partido Novo), que tem defendido a redução do estado e o fim dos programas de caráter assistencial, sem se dar conta de que a direita liberal prefere programas assistenciais focalizados. E a esquerda, hoje, está bem confortável em defender o bolsa família do atual governo, sem se dar conta de que foi contra o mesmo tipo de programa há pouco mais de 10 anos. A mentira de alguns modificou a opinião de muitos.
Hannah Arendt dizia que “só se pode confiar nas palavras na certeza de que sua função é revelar e não dissimular”. Esta frase explica muito de nosso afastamento da política. Há muito a ser dito sobre a verdade, a coisa-em-si e o mundo das aparências. Mas o debate político não tem sequer arranhando estas questões, visto que o debate de ideias foi substituído, há um bom tempo, pela luta pelo poder. No próximo post, trato de fazer algumas considerações sobre a verdade na ciência.
Gustavo Theodoro