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Mais Erros do Governo

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Eu sei, prometi que iria além dos juros e do câmbio. Já chego lá. A campanha está chegando e tenho notado o acirramento da disputa política. Neste momento é ainda mais importante manter o debate técnico, que permita réplica e tréplica sem transformar pessoas em inimigas.

Meu lado Casa das Garças me levou a tratar mais uma vez da política de câmbio e juros. Já expliquei como deixamos passar uma oportunidade durante a crise financeira internacional de 2008 de levar os juros a um patamar condizente com nossa situação fiscal. Perdemos a oportunidade e agora voltamos aos juros de dois dígitos. Há, no entanto, outro erro que vem sendo sistematicamente cometido desde que o Ministro Mantega passou a fazer prevalecer suas ideias.

O Brasil tem pouca poupança privada. A razão disto é daqueles enigmas que atiçam a curiosidade dos economistas. Alguns deles defendem que o risco jurisdicional é a razão de a poupança privada ser tão baixa. Ou seja: todo o histórico brasileiro de pacotes e calotes afastaram o brasileiro dos bancos. Outros defendem que somos mesmo muito pobres e muito consumistas, o que impede a maioria da população de fazer poupança. Independente da explicação para o fato, é certo que tempos poupança privada muito inferior a de outros países.

Isto faz com que a política de juros tenha dificuldade em desacelerar o consumo por meio do aumento da poupança – que é o modo como funciona a correia de transmissão dos juros nos países centrais. Ou seja, ao aumentar os juros, a população tende a deixar de consumir para usufruir da alta rentabilidade. No Brasil, como a poupança privada é baixa, a correia de transmissão, neste caso, não funciona.

No entanto, a política de aumento de juros pode ainda ser eficiente por duas razões: a primeira atua na expectativa do mercado e a segunda na atração do financiamento externo. Os operadores de mercado tendem a esperar inflação menor com o aumento de juros, ainda que as cadeias de transmissão sejam precárias. E as expectativas, em economia, têm importante influência no mercado. A atração do financiamento externo (Hot Money) aprecia o câmbio e provoca déficit na balança comercial (outro nome de poupança externa forçada). Ou seja, o principal mecanismo de transmissão do câmbio para a economia no Brasil é indireto, por meio de recepção de poupança externa, com o custo do aumento de importações e de reservas (que também tem seu custo). Como isso tudo parece inaceitável para o Governo, o câmbio veio sendo mantido em um certo patamar que acaba impedindo que essa perna da correia de transmissão funcione.

Para piorar as expectativas, no segundo Governo Lula houve continuado aumento nos gastos públicos como política deliberada, a fim de que o aumento das taxas de juros não impactasse no PIB. Um efeito natural do aumento dos juros é redução no crescimento. Isto também parecia inaceitável no segundo Governo Lula, o que nos levou a uma aceleração nos gastos públicos e corte nos impostos ao mesmo tempo em que os juros eram mantidos relativamente altos.

O Governo Dilma herdou uma situação fiscal bastante deteriorada. Como se sabe, a manutenção de reservas custa caro. Estabelecer um piso para o câmbio aumenta a retenção de reservas. Aumento dos gastos públicos e a redução dos impostos desfazem o trabalho feito pelo aumento dos juros. Para todos os lados que se olha, são forças opostas que vemos atuar.

Para agravar este quadro, a Presidente Dilma tinha suas próprias concepções sobre a política de juros. O fato de a taxa de juros permanecer alta fez nascer a tese de que se poderia dar uma pancada nos juros para baixo sem consequências econômicas. Era uma tese muito adequada ao Governo, já que os gastos com os juros da dívida interna são muito altos. Com a situação fiscal deteriorada, economia no pagamento dos juros parecia a saída natural. E foi este o caminho escolhido pelo Governo. Foi um teste importante: se os juros fossem altos por motivos históricos, sua redução não implicaria repique da inflação. O resultado desta aposta, no entanto, tem nos custado caro. A redução dos juros fez a inflação permanecer no limite superior da banda. Reafirmando a aposta feita, o Governo passou a controlar as tarifas públicas, como energia elétrica e gasolina, para evitar o descontrole inflacionário. Ocorre que controlar tarifas também tem seu custo, o que contribuiu na piora da situação fiscal do Governo.

Só em meados de 2013 o Governo admitiu o erro, recomeçando o ciclo de alta de juros. Todos os desequilíbrios introduzidos pela tentativa de reduzir os juros com base na vontade política precisam ser revertidos. Ocorre que a reversão dessas políticas teria impacto na inflação, mas também nas eleições. Logo, os ajustes ficarão para 2015.

É certo que a crise internacional teve importante efeito sobre o crescimento do Brasil no Governo Dilma. Mas não é possível tirar a responsabilidade da equipe econômica pelo fato de termos o menor crescimento econômico desde o Governo Collor. Qualquer que seja o vencedor do pleito presidencial deste ano, é muito provável que o ano de 2015 seja ano de ajuste ou, em termos mais claros, ano de aperto econômico, a não ser que continuemos apostando no desequilíbrio. Até porque a redução dos juros como ato de vontade política já foi testada e está claro que não atingiu os resultados pretendidos. Parece que juros e inflação não são causa, mas sintoma, de nossos desajustes.

Gustavo Theodoro

Além do Tripé Econômico

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A eleição presidencial que se avizinha é a mais aberta dos últimos anos. Em 2002 havia um clima de mudança no ar. O segundo mandato do Governo Fernando Henrique apresentou crescimento econômico pífio. Diversas suspeitas foram levantadas acerca do processo de privatização de estatais. Houve racionamento de energia elétrica, revelando a carência de investimentos governamentais em área estratégica para o País.

A eclosão do escândalo do mensalão 2005 parecia pôr fim ao Governo Lula já em seu primeiro mandato. O clima era de fim de festa no dia em que Duda Mendonça confessou ter recebido a pagamento no exterior por sua atuação em campanhas do PT. Mas o Governo foi bem avaliado e já no início do ano de 2006 Lula havia recuperado a estima do povo.

Ao final do segundo mandato do Presidente Lula, com a superação da crise econômica internacional pelo Brasil, a avalição do Governo Lula era ainda melhor e, mesmo tendo segundo turno naquelas eleições, a vitória da Presidente Dilma foi razoavelmente tranquila.

O cenário hoje é muito diferente do observado nas últimas duas eleições. Há um impreciso clima de insatisfação no ar, representado em parte pelas manifestações que tiveram início em junho de 2011. Pesquisas de opinião têm relevado um contingente de insatisfeitos há muito tempo não observado no Brasil.

Diante deste cenário, faz-se mais necessária uma análise isenta da situação, uma análise equidistante, de modo que possamos entender em que medida estão corretas as avaliações aos 12 anos de Governo de PT e a pertinência das críticas e propostas da oposição neste momento. Eleições apertadas exigem maiores compromissos do eleito com os eleitores. Isso pode ser bom, desde saibamos cobrar dos políticos as respostas aos nossos questionamentos.

O que a mim me parece certo é que os Governos – todos eles – vêm cometendo erros nos últimos anos que fazem com que o Brasil tenha inflação alta (1973 a 1994), cambio artificial (1995 a 1998), juros altos (1999 a 2008) e juros e inflação acima do desejável (de 2008 até agora) por todo esse tempo. Poucos economistas conseguem explicar por que a taxa de juros no Brasil precisa ser tão alta e por que ela é tão pouco eficiente no combate à inflação. Mas é certo que isso tem relação com erros cometidos por nossos governos desde a ditadura militar.

Na próxima coluna – que deve ser entremeada por mais uma porta da percepção – vou rever meu próprio histórico em busca de avaliar se eu tenho condições de fazer uma análise isenta do assunto. A seguir, devo destacar alguns pontos da política econômica e social do PT que muito me agradam. Só então passarei a tratar das críticas a essa política econômica, muitas delas já levantadas por outros economistas. Pretendo, outrossim, ir além da velha discussão de câmbio, juros e tripé econômico, se a tanto me ajudar o engenho e a arte.

Gustavo Theodoro